Fiquei a saber à umas horas que faleceu uma senhora com quem trabalhei, ou melhor, que colaborou comigo nos primeiros tempos da instituição na Cidade do México.
Não sei se foi à pouco ou muito tempo, no entanto ao ficar a saber, que esta senhora já não está entre nós, não pude deixar de experimentar alguns sentimentos um pouco contraditórios.
Senti uma imediata tristeza, por pensar que uma mulher com a energia que demonstrava, a fé que apregoava e as obras que foi deixando, partiu. No entanto no momento em que o cérebro foi começando a ganhar terreno ao coração, fui-me lembrando de episódios da minha vida e da nossa convivência. Essa tristeza foi-se esvaindo até se transformar num sentimento perturbador, que estou para aqui a tentar articular...
Capaz de coisas fantásticas, sabia utilizar o facto de ser parte de uma das famílias mais abastadas do México para mobilizar vontades e capacidades para transformar uma pequena ideia numa grande obra. Foi também capaz de ameaçar deixar miúdos a dormir no chão ou sem colheres e garfos, porque achava que o seu orgulho era mais importante que o bem estar de 14 crianças.
Essas acções, que as julgue quem de direito. Em retrospectiva e de um modo muito particular e pessoal, foi a primeira pessoa a tornar-me profundamente desconfiado das grandes promessas de amizade e fidelidade. Tratou-me como filho, chamou-me de filho, até ao momento em que discordei das suas ideias e deixei de fazer o que ela ditava. Foram quase 3 anos de amizade, quase 3 anos de convivência e partilha de ideias e ideais que se esvaíram! De filho passei a "Judas".... e nunca mais a voltei a ver. Palavras vãs....
Depois do momento em que mandou os seus funcionários retirar as doações que tinha conseguido para a instituição (acho que já escrevi sobre este episódio anteriormente), só voltei a saber dela por duas ocasiões. Quando se envolveu com uma outra instituição para ajudar meninas da rua e hoje quando me disseram que tinha falecido.
Não posso dizer que aprendi muito com ela. Conheci gente mais pura e congruente, mas infelizmente pouca gente encontrei que me tenha deixado tão reticente e desconfiado em acreditar em boas intenções e grandes sentimentos. Com ela aprendi a ter sempre 1000 cuidados e 1000 dúvidas. Mas tenho que reconhecer que no fundo ela era uma pessoa que queria fazer o bem.
Não consigo articular uma despedida ou um sentimento concreto em relação a esta senhora, sinto-me emocionalmente anestesiado!
A língua inglesa tem uma expressão que me simplifica a descrição deste texto que acabei de escrever.... "Closure"